22 de fevereiro de 2021
Por Katia Gisele Costa
Você já deve ter ouvido algumas vezes a seguinte frase “no meu tempo as coisas eram diferentes”. Realmente eram e é assim que tem que ser. As coisas mudam, as gerações ganham novas características, a ciência evolui. Nas últimas décadas a tecnologia invadiu as nossas vidas e isso tudo nos trouxe uma maneira mais ágil, ou mais imediatista para resolver problemas e conquistar o que queremos de forma decisiva.
Quem está na faixa dos 40 anos ainda se lembra que quando éramos crianças ganhávamos brinquedos em três datas do ano: no aniversário, no Dia das Crianças e no Natal. E hoje? Quantas vezes por ano você compra brinquedos para os seus filhos? Quanto tempo a criança de hoje precisa esperar para ganhar o presente que quer? Estas perguntas precisam ser respondidas por nós pais, porque ao tentar agradar nossos filhos dando a eles o que não tivemos, estamos por outro lado “pulando etapas”, gerando ansiedade e impedindo que eles ganhem as noções de resiliência, de esforço e de mérito. Isto pode trazer insegurança e tristeza.
Vários pedagogos, filósofos, médicos e estudiosos do desenvolvimento e comportamento infantil, como Jane Nelson, Içami Tiba, Mario Sérgio Cortela, Gustavo Teixeira entre outros há anos vêm falando sobre como pais e professores podem e devem ajudar na manutenção da saúde mental das crianças. Um ponto abordado por eles é a ansiedade que domina o comportamento infantil atual. As razões do surgimento da ansiedade, que tem atingido uma parte das crianças e adolescentes, vão desde famílias que trabalham bastante, mantendo-se afastados dos filhos e buscando compensar isto dando-lhes “coisas” ao invés de tempo; até a forma com que os adultos têm de sanar suas próprias frustrações na vida dos filhos. Esta projeção tem causado danos na saúde mental das crianças porque quanto mais “coisas” elas ganham, menos conseguem lidar com a frustração causada quando recebem um não como resposta.
No universo escolar percebemos que já há alguns anos, nestes tempos modernos, temos crianças entendidas como líderes nas nossas salas de aula, mas os líderes que temos visto possuem um caráter autoritário, determinador e isso não é a liderança desejada. São traços de autoritarismo que as crianças têm reproduzido quando decidem o que fazer nas brincadeiras, decidem quem pode e quem não pode brincar, impõem as consequências dos comportamentos indesejados, mas não sabem administrar a situação e o próprio comportamento quando o mesmo acontece com elas. A escola tem trabalhado o inverso. Temos buscado construir um líder em cada um, para que juntos com a força da liderança se consigam decisões democráticas, se preserve o bem comum, a partilha e se melhore a qualidade de vida da coletividade e a saúde mental de cada pessoa.
Percebemos que alguns pais têm feito uma pequena confusão entre deixar a criança expressar suas vontades e deixá-la decidir. Em uma relação madura entre pais e filhos, o adulto é o mais experiente e, portanto, está nele o poder da decisão. Quando esse papel se inverte a criança sente-se desorientada mentalmente e por isso chora, grita, manifesta um comportamento de tristeza, de pavor e ansiedade, sendo por vezes até agressiva com o adulto que a cuida, pois, ela não está ainda preparada para decidir.
Para ajudarmos uma criança a crescer mentalmente saudável precisamos promover discussões, simular problemas a serem solucionados, deixar que tome conta do irmão mais novo, que partilhe, que pratique a resiliência. Devemos propiciar desafios controlados pois, ao permitirmos momentos de frustração, a criança amadurece e aprende a levar a vida de um jeito mais leve. O choro, o grito que vem em seguido do não como resposta fazem parte do crescer. Não é dor nem sofrimento, é amadurecimento. Valorize o que uma criança faz de bom, faça elogios, lhe dê oportunidade para mostrar o quanto já cresceu, mas, se precisar dizer não, diga. É esse conjunto harmonioso que envolve atitudes de bondade, pensamento coletivo, frustração, adaptação mental e domínio das emoções que constrói a sinergia. Assim os adultos ajudam a criança a encontrar seu equilíbrio, a ser feliz e mentalmente saudável.
Katia Gisele Costa é Pedagoga pela Universidade Estadual de Ponta Grossa e Mestre em Educação pela Universidade do Minho (Portugal). É Coordenadora Pedagógica – Educação Infantil no Colégio Pontagrossense SEPAM, de Ponta Grossa-PR.
Artigo publicado na edição de Fevereiro/2021 da Revista Saúde.